Disparos laser mostram que o bombardeamento de asteroides e o hidrogênio são bons "ingredientes" para a "receita" da vida em Marte
Este auto-retrato do rover Curiosity da NASA mostra o veículo na Cratera Gale em Marte. O norte está para a esquerda e o oeste à direita, os limites da Cratera Gale em ambos os lados. Este mosaico foi montado a partir de dúzias de imagens obtidas pelo instrumento MAHLI (Mars Hands Lens Imager) do Curiosity. Foram todas captadas no dia 23 de janeiro de 2018, durante o sol 1943.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/MSSS
Um novo estudo revela que os impactos de asteroides no passado de Marte podem ter produzido ingredientes essenciais para a vida caso a atmosfera marciana tenha sido rica em hidrogênio. Uma atmosfera inicial rica em hidrogênio também explicaria como o planeta permaneceu habitável depois da sua atmosfera ter ficado mais fina. O estudo usou dados do rover Curiosity da NASA e foi realizado por investigadores da equipa do instrumento SAM (Sample Anaylsis at Mars) do Curiosity e por colegas internacionais.
Estes ingredientes-chave são nitritos (NO2-) e nitratos (NO3-), formas fixas de azoto que são importantes para o estabelecimento e sustentabilidade da vida como a conhecemos. O Curiosity descobriu estes elementos em amostras de solo e rocha ao atravessar a Cratera Gale, local de antigos lagos e sistemas de águas subterrâneas em Marte.
Para compreender como o azoto fixado pode ter sido depositado na cratera, os cientistas precisaram de recriar a atmosfera primitiva de Marte aqui na Terra. o estudo, liderado pelo Dr. Rafael Navarro-González e pela sua equipa de cientistas do Instituto de Ciências Nucleares da Universidade Nacional Autônoma do México, na Cidade do México, usou uma combinação de modelos teóricos e dados experimentais para investigar o papel do hidrogênio na alteração de azoto em nitritos e nitratos usando a energia de impactos de asteroide. O artigo foi publicado na edição de janeiro da revista Journal of Geophysical Research: Planets.
No laboratório, o grupo usou pulsos laser para simular as ondas de choque altamente energéticas criadas por asteroides que colidem com a atmosfera. Os pulsos foram focados num frasco contendo misturas dos gases hidrogênio, azoto e dióxido de carbono, representando a atmosfera primitiva de Marte. Após os pulsos laser, a mistura resultante foi analisada para determinar a quantidade de nitratos formados. Os resultados foram, no mínimo, surpreendentes.
"A grande surpresa foi que a quantidade de nitrato aumentou quando o hidrogênio foi incluído nas experiências que simularam os impactos de asteroides," disse Navarro-González. "Isto foi contra-intuitivo, já que o hidrogênio leva a um ambiente pobre em oxigênio, enquanto a formação de nitratos requer oxigênio. No entanto, a presença de hidrogênio levou a um arrefecimento mais rápido do gás aquecido pelo choque, prendendo óxido nítrico, o percursor do nitrato, a temperaturas elevadas onde a sua quantidade produzida era maior."
Embora estas experiências tenham sido realizadas num ambiente controlado de laboratório, a milhões de quilômetros do Planeta Vermelho, os cientistas queriam simular os resultados obtidos com o Curiosity usando o instrumento SAM. O SAM recolhe amostras perfuradas de rochas ou tiradas da superfície pelo braço mecânico do rover e "cozinha-as" para examinar as impressões digitais químicas dos gases libertados.
"O SAM, a bordo do Curiosity, foi o primeiro instrumento a detetar nitrato em Marte," disse Christopher McKay, coautor do artigo do Centro de Pesquisa Ames da NASA em Silicon Valley, no estado norte-americano da Califórnia. "Devido aos baixos níveis de azoto gasoso na atmosfera, o nitrato é a única forma biologicamente útil de azoto em Marte. Assim, a sua presença no solo é de grande importância astrobiológica. Este artigo científico ajuda-nos a entender as possíveis fontes desse nitrato."
Porque é que os efeitos do hidrogênio são tão fascinantes? Embora a superfície de Marte seja hoje fria e inóspita, os cientistas pensam que uma atmosfera mais espessa, enriquecida com gases de efeito estufa, como dióxido de carbono e vapor de água, pode ter aquecido o planeta no passado. Alguns modelos climáticos mostram que pode ter sido necessária a adição de hidrogênio na atmosfera a fim de elevar a temperatura o suficiente para ter água líquida à superfície.
"Ter mais hidrogênio como gás de efeito estufa na atmosfera é interessante tanto para a história climática de Marte quanto para a sua habitabilidade," acrescentou Jennifer Stern, geoquímica planetária do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland, EUA, co-investigadora do estudo. "Se temos uma ligação entre duas coisas boas para a habitabilidade - um clima potencialmente mais quente com água líquida à superfície e um aumento na produção de nitratos, que são necessários para a vida - é muito emocionante. Os resultados deste estudo sugerem que estes dois itens, que são importantes para a vida, encaixam juntos e melhoram a presença um do outro."
Mesmo que a composição da atmosfera primitiva de Marte continue a ser um mistério, estes resultados podem fornecer mais peças para resolver este enigma climático.
Uma porção da configuração experimental que Rafael Navarro-González, astrobiólogo do Instituto de Ciências Nucleares da Universidade Nacional Autónoma do México, na Cidade do México, co-investigador do SAM, e sua equipa de cientistas usaram para simular impactos de asteroides na atmosfera primitiva de Marte. O frasco (centro) contém uma composição dos gases dióxido de carbono, azoto e hidrogênio. Um laser infravermelho de alta intensidade está focado no frasco graças a uma lente (esquerda), para simular as ondas de choque altamente energéticas produzidas pelos asteroides que entram na atmosfera marciana. O gás e então evacuado do frasco e analisado para determinar a composição e níveis de fixação de azoto.
Crédito: Rafael Navarro-González
FONTE: ASTRONOMIA ONLINE
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