Estudo afirma que os animais surgiram da junção de lulas e micróbios extraterrestres — teoria é rebatida por pesquisadores
Não há como negar que polvos são bichos esquisitos. Veja só, eles são animais dotados de oito tentáculos – os quais estão conectados diretamente às suas cabeças –, estão presentes em todos os oceanos da Terra, podem mudar de cor quando enfrentam situações de perigo e são capazes de amputar partes do corpo espontaneamente (processo conhecido por autotomia).
As características desses cefalópodes são tão particulares que há quem diga por aí que polvos são animais de outro mundo – inclusive gente de dentro da área científica. Essa opinião deu base teórica para um novo estudo publicado no periódico científico Progress in Biophysics and Molecular Biology.
O estudo foi realizado com a coautoria de mais de 30 pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento (embora não haja ninguém do campo da zoologia), entre eles o controverso astrônomo Chandra Wickramasinghe, ferrenho adepto à teoria da panspermia. A hipótese sugere que a vida na Terra se desenvolveu a partir de micróbios e bactérias extraterrestres.
Wickramasinghe é malvisto por seus pares, pois há décadas e em diversas oportunidades vem tentando provar o conceito a qualquer custo. No entanto, a panspermia continua sem evidências capazes de comprovar sua veracidade.
Ainda assim, Wickramasinghe decidiu seguir com a mesma hipótese neste novo trabalho, no qual considera uma possível explicação alienígena para a Explosão Cambriana, evento ocorrido há 500 milhões de ano e que marcou o surgimento de organismos diversificados na Terra.
Em outras palavras, o astrônomo e os outros autores do artigo científico afirmam que a chegada de micróbios alienígenas possibilitou o surgimento de novas formas de vida mais complexas na Terra, sendo uma delas os polvos.
“O genoma do polvo possui um impressionante nível de complexidade”, escrevem os pesquisadores, mencionando, também o cérebro grande e os olhos ágeis do animal. “A evolução de lulas para os polvos é compatível com uma série de genes inseridos [na Terra] por vírus extraterrestres”, continuam eles.
Como se não fosse o suficiente, o grupo surge com outra proposta caso os micróbios aliens não sejam a explicação para o surgimento das formas de vida mais complexas. Segundo os autores, pode ser que os ovos de polvos – e também de lulas – tenham sido criopreservados (ou seja, tenham tido suas células e tecidos biológicos congelados) e chegado à Terra por meio de um cometa.
SEGUNDO OS AUTORES DO ESTUDO, A LULA DEU ORIGEM AO POLVO AO ENTRAR EM CONTATO COM UM CONJUNTO DE BACTÉRIAS EXTRATERRESTRES (FOTO: REPRODUÇÃO)
Essas e outras teorias bizarras apresentadas ao longo do artigo incomodaram diversos pesquisadores das áreas de ciência da natureza, que receberam o estudo com ceticismo. Eles discutem e apontam os erros no documento:
“Não faz nenhum sentido. Dizer que algo é tão complexo que só pode ter vindo do espaço é até infantil. Existem genomas muito mais complexos que o dos cefalópodes”, afirma à GALILEU o astrobiólogo Ivan Paulino Lima, pesquisador da Universities Space Research Association e da NASA Ames.
Segundo Lima, estudos que se baseiam na teoria da panspermia não são conclusivos, o que abre caminho para diversos mal entendidos. “Sei disso porque minha tese de doutorado foi sobre panspermia e eu tive bastante problema durante a revisão de literatura”, comenta o pesquisador.
Lá fora, a comunidade científica também está se posicionando contra o estudo, tal como o paleontologista Mark Carnall, do Museu de História Natural da Universidade de Oxford. Em seu perfil no Twitter, ele escreveu: “[O estudo] é sem noção e não respeita os princípios básicos da biologia e evolução dos cefalópodes. Há algumas palavras bonitas e referências recentes verdadeiras, mas a coisa toda deveria ser rapidamente descartada".
I've only looked through the #cephalopod bits in detail. It is a nonsense, not standing up to the most basic understanding of cephalopod biology & evolution. There are some fancy words and some recent real references but the whole thing should be quickly flushed out the siphon.
— Mark Carnall (@mark_carnall) 15 de maio de 2018
O geólogo Seth Finnegan, professor assistente da Universidade da Califórnia, Berkeley, declarou seu descontentamento com certo tom de deboche. "Como era previsível, o artigo é terrível, mas a figura 5 é muito convincente", twittou:
This paper is predictably terrible, but Figure 5 is pretty damn compelling. https://t.co/09zzl1SSsj pic.twitter.com/b54xgpXwPg
— Seth Finnegan (@sethfinnegan1) 15 de maio de 2018
Já o biólogo evolucionário Jonathan Eisen, professor da Universidade da Califórnia, Davis, também brincou com a foto que explica que as lulas, somadas a micróbios alienígenas, deram origem aos polvos:
The paper is, well, not good (shocking - I know) but it does have on of the best figures I have seen describing the origins of octopi from space viruses pic.twitter.com/NqwhhEU0jD
— Jonathan Eisen (@phylogenomics) 15 de maio de 2018
Ou seja, apesar de a ficção científica adorar representar ETs com jeitão de cefalópodes, não há nenhuma razão evidente para acreditarmos que os polvos são bichos extraterrestres. Suas características adaptativas têm apenas uma explicação: a evolução. Um processo tão extraordinário quanto a possibilidade de vida alienígena.
Com informações de IFLScience.
FONTE: REVISTA GALILEU
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