Esta animação mostra como a iluminação do hemisfério norte de Ceres varia com a inclinação axial do planeta anão. As regiões à sombra são realçadas para inclinações de 2 graus, 12 graus e 20 graus.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/UCLA/MPS/DLR/IDA
O planeta anão Ceres pode estar a centenas de milhões de quilômetros de Júpiter, e ainda mais longe de Saturno, mas a tremenda influência gravitacional destes gigantes gasosos tem um efeito apreciável na orientação de Ceres. Num novo estudo, investigadores da missão Dawn da NASA calcularam que a inclinação axial de Ceres - o ângulo de inclinação do seu eixo enquanto viaja em redor do Sol - varia muito ao longo de aproximadamente 24.500 anos. Os astrônomos consideram que este é um período de tempo surpreendentemente curto para tais dramáticos desvios.
As mudanças na inclinação do eixo, ou "obliquidade", ao longo da história de Ceres, estão relacionadas com a maior questão de onde a água gelada pode ser encontrada à superfície de Ceres, relatam os cientistas na revista Geophysical Research Letters. Dadas as condições em Ceres, o gelo só seria capaz de sobreviver em temperaturas extremamente frias - por exemplo, em áreas que nunca estão expostas ao Sol.
"Nós descobrimos uma correlação entre as crateras que ficam à sombra na obliquidade máxima e os depósitos brilhantes que são provavelmente compostos por água gelada," comenta Anton Ermakov, investigador pós-doutorado do JPL da NASA em Pasadena, no estado norte-americano da Califórnia, autor principal do estudo. "As regiões que nunca vêm a luz do Sol, ao longo de milhões de anos, são mais propensas a albergar estes depósitos."
Ciclos de obliquidade
Os cálculos indicam que, ao longo dos últimos três milhões de anos, Ceres passou por ciclos onde a sua inclinação variava entre cerca de 2 graus e cerca de 20 graus.
"Nós não podemos observar diretamente as mudanças na orientação de Ceres ao longo do tempo, de modo que usamos medições da sua forma e gravidade, pela sonda Dawn, para reconstruir com precisão o que se revelou uma história dinâmica," comenta Erwan Mazarico, coautor do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, Maryland, EUA.
Segundo os investigadores, a última vez que o planeta anão atingiu uma inclinação máxima, cerca de 19 graus, foi há 14.000 anos atrás. Em comparação, a Terra está inclinada 23,5 graus. Esta inclinação significativa faz com que o nosso planeta tenha estações: é verão no hemisfério norte quando o eixo está orientado para o Sol, e inverno quando está orientado na direção oposta. Em contraste, a inclinação atual de Ceres ronda os 4 graus, por isso não terá efeitos sazonais tão fortes ao longo do seu "ano" (que corresponde a aproximadamente 4,6 anos terrestres).
Como a Obliquidade se Relaciona com o Gelo
Quando a inclinação axial é pequena, as regiões relativamente grandes de Ceres nunca recebem luz solar direta, particularmente nos polos. Estas regiões persistentemente à sombra ocupam uma área de aproximadamente 2000 quilômetros quadrados. Mas quando a obliquidade aumenta, mais crateras nas regiões polares recebem exposição direta ao Sol, e as áreas persistentemente à sombra apenas ocupam entre 1 e 10 quilômetros quadrados. Os cientistas da Dawn dizem que estas áreas à superfície de Ceres, que permanecem à sombra mesmo a uma obliquidade alta, podem ser frias o suficiente para manter gelo à superfície.
Estas crateras com áreas que permanecem à sombra durante longos períodos de tempo são chamadas "armadilhas frias", porque são tão frias e escuras que os voláteis - substâncias facilmente vaporizadas - que migram para estas áreas não podem escapar, até durante mais de mil milhões de anos. Um estudo de 2016, publicado na Nature Astronomy pela equipa da Dawn, relata a descoberta de material brilhante em 10 destas crateras, e dados do espectrômetro de mapeamento visível e infravermelho da Dawn indicam que uma delas contém gelo.
O novo estudo centrou-se em crateras polares e modelou como a sombra progride à medida que a inclinação axial de Ceres varia. No hemisfério norte, apenas duas regiões persistentemente à sombra assim permanecem durante a inclinação máxima de 20 graus. Ambas as regiões têm, hoje, depósitos brilhantes. No hemisfério sul também existem duas regiões persistentemente à sombra à maior obliquidade e uma delas tem claramente um depósito brilhante.
Regiões à Sombra em Contexto
Ceres é o terceiro corpo do Sistema Solar onde se descobriram regiões permanentemente à sombra. Mercúrio e a Lua da Terra são os outros dois, e os cientistas pensam que recebem o seu gelo graças a corpos impactantes. No entanto, Mercúrio e a Lua não têm uma variabilidade tão grande de inclinação axial graças à influência gravitacional estabilizadora do Sol e da Terra, respetivamente. A origem do gelo nas armadilhas frias de Ceres é mais misteriosa - pode ter origem no próprio Ceres, ou ter sido entregue por impactos de asteroides e cometas. De qualquer forma, a presença de gelo nas armadilhas frias pode estar relacionada com uma ténue atmosfera de água, detetada pelo Observatório Espacial Herschel da ESA em 2012-13. As moléculas de água que deixam a superfície cairiam de volta para Ceres, algumas aterrando nas armadilhas frias e aí ficando acumuladas.
"A ideia de que a água gelada pode sobreviver em Ceres durante longos períodos de tempo é importante, à medida que continuamos a reconstruir a história geológica do planeta anão, incluindo se tem emitido vapor de água," comenta Carol Raymond, vice-investigadora principal da missão Dawn no JPL e coautora do estudo.
FONTE: http://www.ccvalg.pt
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