Representação esquemática das órbitas de seis dos sete objetos transneptunianos extremos (ETNOs) usados para propôr a hipótese do "Planeta Nove". A elipse tracejada mostra a órbita deste possível planeta.
Crédito: Wikipedia
As propriedades dinâmicas destes asteroides, observados espectroscopicamente pela primeira vez usando o Gran Telescopio CANARIAS, sugerem uma possível origem comum e dão uma pista para a existência de um planeta para lá de Plutão, o chamado "Planeta Nove".
No ano 2000 foi descoberto o primeiro de uma nova classe de objetos do Sistema Solar distante, orbitando o Sol a uma distância maior do que a de Neptuno: os objetos transneptunianos extremos (em inglês extreme trans Neptunian objects, ou ETNOs). As suas órbitas estão muito longe do Sol em comparação com a da Terra. Nós orbitamos o Sol a uma distância média de 1 Unidade Astronômica (1 UA corresponde a 150 milhões de quilômetros), mas os ETNOs orbitam a mais de 150 UA. Para termos uma ideia de quão longe estão, a órbita de Plutão ronda as 40 UA e a sua maior aproximação ao Sol (periélio) situa-se nas 30 UA. Esta descoberta marcou um ponto de viragem nos estudos do Sistema Solar e, até agora, foram identificados um total de 21 ETNOs.
Recentemente, vários estudos sugeriram que os parâmetros dinâmicos dos ETNOs podem ser melhor explicados se existisse um ou mais planetas com massas várias vezes a da Terra orbitando o Sol a distância de centenas de UA. Em particular, em 2016 os investigadores Brown e Batygin usaram as órbitas de sete ETNOs para prever a existência de uma "superterra" em órbita do Sol a cerca de 700 UA. Esta gama de massas é denominada subneptuniana. Esta ideia é referida como Hipótese do Planeta Nove e é um dos temas atuais de mais interesse na ciência planetária. No entanto, dado que os objetos estão tão distantes, a luz que recebemos deles é muito fraca e até agora o único dos 21 objetos transneptunianos observados espectroscopicamente era Sedna.
Agora, uma equipa de investigadores liderados pelo Instituto de Astrofísica das Canárias (IAC), em colaboração com a Universidade Complutense de Madrid, deu um passo em direção à caracterização física destes corpos e, através do seu estudo, confirmar ou refutar a Hipótese do Planeta Nove. Os cientistas fizeram as primeiras observações espectroscópicas de 2004 VN112 e 2013 RF98, ambos particularmente interessantes dinamicamente porque as suas órbitas são quase idênticas e os polos das órbitas estão separados por um ângulo muito pequeno. Isto sugere uma origem comum e as suas órbitas atuais podem ser o resultado de uma interação passada com o hipotético Planeta Nove. Este estudo, recentemente publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, sugere que este par de ETNOs foi um asteroide binário que se separou depois de um encontro com um planeta para lá da órbita de Plutão.
Para chegar a estas conclusões, fizeram as primeiras medições espectroscópicas de 2004 VN112 e 2013 RF98 no visível. Estas foram realizadas em colaboração com os astrônomos Gianluc Lombardi e Ricardo Scarpa, usando o espectrógrafo OSIRIS acoplado ao Gran Telescopio CANARIAS (GTC), situado no Observatório Roque de los Muchachos (Garafía, La Plama). Foi um trabalho árduo identificar estes asteroides porque a sua grande distância significa que o seu movimento aparente no céu é muito lento. Então, mediram as suas magnitudes aparentes (o seu brilho visto a partir da Terra) e também recalcularam a órbita de 2013 RF98, que tinha sido mal determinada. Descobriram este objeto a uma distância de mais de um minuto de arco da posição prevista a partir das efemérides. Estas observações ajudaram a melhorar a órbita computacional e foram publicadas pelo Centro de Planetas Menores, o organismo responsável pela identificação de cometas e planetas menores (asteroides), bem como pelas medições dos seus parâmetros e posições orbitais.
O espectro visível pode também dar algumas informações sobre a sua composição. Medindo a inclinação do espectro, podemos ficar a saber se têm gelo puro às suas superfícies, como é o caso de Plutão, bem como compostos de carbono altamente processados. O espectro também pode indicar a possível presença de silicatos amorfos, como nos asteroides troianos associados com Júpiter. Os valores obtidos para 2014 VN112 e 2013 RF98 são quase idênticos e semelhantes àqueles observados fotometricamente para outros dois ETNOs, 2000 CR105 e 2012 VP113. No entanto, Sedna, o único destes objetos previamente observado espectroscopicamente, mostra valores muitos diferentes dos restantes. Estes cinco objetos fazem parte do grupo de sete usados para testar a Hipótese do Planeta Nove, o que sugere que todos deveriam ter uma origem comum, à exceção de Sedna, que se pensa ter vindo da parte interna da nuvem de Oort.
"Os gradientes espectrais semelhantes observados para o par 2004 VN112 - 2013 RF98 sugerem uma origem física comum," explica Julia de León, a autora principal do artigo, astrofísica do IAC. "Estamos a propor a possibilidade de terem sido anteriormente um asteroide binário que se afastou durante um encontro com um objeto mais massivo." Para validar esta hipótese, a equipa realizou milhares de simulações numéricas para ver como os polos das órbitas se separariam com o passar do tempo. Os resultados destas simulações sugerem que um possível Planeta Nove, com uma massa entre 10 e 20 massas terrestres, orbitando o Sol a uma distância entre 300 e 600 UA, pode ter desviado o par 2004 VN112 - 2013 RF98 há cerca de 5 a 10 milhões de anos atrás. Isto poderia explicar, em princípio, como estes dois asteroides, que começaram como um par em órbita um do outro, se separaram gradualmente nas suas órbitas porque fizeram uma aproximação a um objeto muito mais massivo num momento particular do seu passado.
Sequência de imagens obtidas com o GTC (Gran Telescopio Canarias) para identificar um dos ETNOs estudados neste artigo, 2013 RF98, onde podemos ver como se move durante quatro noites consecutivas. À direita está o espectro visível obtido com o GTC dos dois objetos 2004 VN112 e 2013 RF98. As linhas vermelhas mostram os gradientes do espectro.
Crédito: Julia de León (IAC)
FONTE: http://www.ccvalg.pt
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