A nova corrida espacial - que agora é disputada por companhias privadas
Esqueça tudo o que você já sabe sobre a exploração espacial.
Desde o lançamento do primeiro satélite comercial, o Sputnik, em 1957, e do voo de Yuri Gagarin em 1961 (o primeiro a viajar ao espaço), a conquista do universo vem sendo dominada pela rivalidade entre Rússia (então União Soviética) e Estados Unidos - as duas potências chegaram, inclusive, a disputar quem colocaria o primeiro homem na Lua.
Nessa disputa, não havia espaço para empreendedores individuais - eram os governos quem tomavam as rédeas e pagavam pelos vultosos investimentos.
Russo Yuri Gagarin foi primeiro homem a ir ao espaço
É verdade que o primeiro satélite comercial - Intelsat I (apelidado de Early Bird) - foi lançado em 1965, mas até recentemente o desenvolvimento comercial do espaço foi quase que em sua totalidade limitado por grandes satélites de telecomunicações.
A um custo individual de centenas de milhões de dólares e pesando várias toneladas, eles eram concebidos para durar 15 anos, de modo que os investidores pudessem amortizar os gastos.
Apolo 14 foi terceiro pouso de uma nave na Lua (STF)
Mas uma revolução vem ocorrendo. Avanços tecnológicos estão transformando os modelos tradicionais de operação no espaço.
Uma série de empresas promete, agora, baratear o acesso ao espaço, usando desde foguetes reutilizáveis a sistemas de lançamento horizontais.
Os satélites também estão ficando menores e mais baratos de construir - há, agora, cerca de 1,5 mil deles orbitando ao redor de nós.
Em 1961, russo Yuri Gagarin, então com 27 anos, viajou ao espaço pela primeira vez (KEYSTONE)
Além disso, um fluxo impressionante de dados e imagens está chegando do espaço - e novos atores estão agora processando, interpretando e comercializando essa informação.
"Hoje, podemos criar um equipamento do tamanho de uma caixa de sapatos, que no passado seria do tamanho de um ônibus", explica Stuart Martin, CEO da Satellite Applications Catapult, uma incubadora de negócios sediada no Reino Unido que ajuda start-ups voltadas para a exploração espacial.
EUA foi primeiro país a chegar à Lua; na foto, Edwin 'Buzz' Aldrin (NASA)
O investimento está aumentando no setor espacial. Em 2016, essa indústria somou US$ 329 bilhões (R$ 1 milhão), com três quartos do total vindo de empresas - e não de governos.
Os foguetes são a nossa porta de entrada para o espaço, ou seja, caminhões de entrega essenciais. Eles encapsulam nossos esforços para se tornar uma verdadeira civilização espacial. E quando se trata de foguetes, são os bilionários que estão liderando essa empreitada.
Com Blue Origin, Jeff Bezos, fundador e CEO da Amazon, está desenvolvendo seus próprios lançadores (BLUE ORIGIN)
O americano Elon Musk, da SpaceX, está usando seus foguetes Falcon 9 para abastecer a Estação Espacial Internacional, enquanto a Blue Origin, de Jeff Bezos, fundador e CEO da Amazon, está desenvolvendo seus próprios lançadores.
As duas empresas vêm demonstrando técnicas revolucionárias que permitem um pouso vertical - um passo significativo no reuso de foguetes.
Americano John Glenn foi primeiro austronauta a entrar em órbita da Terra (GETTY IMAGES)
Enquanto isso, Richard Branson, dono do grupo Virgin, está focado em desenvolver satélites que podem ser lançados do ar. Isso sem falar em seus planos para voos turísticos suborbitais.
Um dos novos atores dessa indústria em ebulição é a Rocket Lab, da Nova Zelândia.
Ainda engatinhando, é a única empresa de foguetes no mundo com seu próprio complexo de lançamento, localizada na Península Mahia, na Ilha do Norte.
Neste momento, nenhuma companhia de lançamento opera puramente sob uma lógica comercial.
Cápsula New Shepard, da Blue Origin, faz pouso vertical (BLUE ORIGIN)
"Todas elas são fortemente subsidiadas pelos governos de um jeito ou de outro", explica Stuart Martin.
Enquanto os foguetes não mudaram muito desde o Sputnik, em 1957, seria um erro pensar no Rocket Lab como mais um simples fabricante de foguetes tradicional, defende seu fundador, Peter Beck.
Terrabotics captura imagens da Terra (TERRABOTICS)
"Há muita informação entre os pixels que é capturada mas não é óbvia", diz Gareth Mortan, CEO da Terrabotics (TERRABOTICS)
Atualmente, o custo médio de um lançamento de um foguete é de US$ 200 milhões (R$ 625 milhões), e somente nos Estados Unidos no ano passado, por exemplo, houve 22 lançamentos.
Beck diz que, quando seu foguete estiver em operação, será possível ir ao espaço por US$ 5 milhões (R$ 15,6 milhões), e "tão frequentemente quanto uma vez por semana".
A joia da coroa da Rocket Lab é o foguete Electron, desenhado especificamente para levar pequenos satélites ao espaço. O foguete é feito principalmente de fibra de carbono, e seus motores são concebidos a partir de uma impressora 3D.
Dessa forma, diz Beck, em vez de levar meses para produzir um propulsor, "podemos produzi-lo em 24 horas".
Em seu primeiro voo teste, em maio deste ano, o foguete conseguiu chegar ao espaço, mas não entrou em órbita. Dois novos testes estão planejados.
Neste momento, fabricantes de pequenos satélites acabam pegando carona nos lançamentos atuais, que tem um grande satélite como seu principal carregamento, mas ainda assim com espaço para acomodar outros menores.
No entanto, como a demanda pela observação da Terra vem aumentando - clima, viagens, mapas - fabricantes estão flexibilizando as formas de chegar ao espaço.
Essa é a lacuna que o Rocket Lab está planejando preencher, diz Beck. Em vez de esperar por um espaço disponível em um grande foguete, "agora você pode entrar na internet e, por meio de um clique, comprar um lançamento".
Um retrato do planeta
Uma empresa ávida por usar o lançamento da Rocket Lab é a Planet Labs. Sediada em São Francisco, na Califórnia (EUA), a Rocket Lab desenha e constrói seus próprios nanosatélites, que pesam apenas 4 kg.
Diferentemente dos tradicionais satélites de comunicação comercial em órbita geoestacionária, a 35,7 mil km acima da Terra, os satélites da Planet Labs (apelidados de Doves, ou "pombas" em inglês) voam muito mais baixo, a apenas 500 km - uma distância um pouco maior entre Rio e São Paulo.
Empresa de ex-funcionários da Nasa quer 'fotografar' o mundo todo do espaço
A órbita mais baixa sugere que a espaçonave pode usar câmeras menores e, apesar disso, produzir imagem com resolução decente - reduzindo o peso e o custo a uma fração da dos satélites tradicionais.
Além disso, novos designs podem ser testados e construídos rapidamente por causa de seu tamanho e preço, diz a empresa.
Em fevereiro deste ano, a Planet Labs enviou 88 satélites ao espaço, e, em julho, outros 48.
A empresa pode agora fotografar qualquer ponto do planeta todos os dias.
"Conseguimos eliminar as restrições de oferta que existiam e reduzir os custos das imagens que estamos registrando - em proporções imensas", diz Will Marshall, cofundador da Planet Labs.
Segundo ele, isso não só significa preços menores para os consumidores, como também garante que os dados disponíveis possam atingir um maior número de pessoas.
Americano Elon Musk, da SpaceX, está usando foguetes Falcon 9 para abastecer Estação Espacial Internacional (JOE RAEDLE)
"Não só governos ou grandes conglomerados podem comprar os nossos dados. Qualquer um pode acessá-los - independentemente se for uma empresa de porte pequeno ou médio, uma ONG, ou um pesquisador em uma universidade", explica.
Start-up quer lançar satélites do tamanho de micro-ondas ao espaço
Apesar disso, enquanto o desenvolvimento de foguetes e satélites - o "hardware" do espaço - ainda concentra todas as atenções, as maiores mudanças estão relacionadas ao uso prático da informação obtida.
Agricultores e companhias de minério, gás e petróleo já estão usando os dados.
Os agricultores, por exemplo, podem ser alertados sobre problemas com as condições do solo, o que ajuda a melhor prepará-los para colheitas ruins. Os pescadores, por outro lado, podem ser avisados sobre as temperaturas dos oceanos e assim saber onde buscar os peixes. Com imagens cada vez mais precisas, árvores podem ser rastreadas de modo a garantir que a madeira seja certificada, evitando, assim, o desmatamento.
Planet Labs pode agora fotografar qualquer ponto do planeta todos os dias (PLANET LABS)
Uma das empresas que está filtrando essa torrente de informação é a Terrabotics, sediada no Reino Unido.
"Em uma imagem normal, você está limitado ao tamanho de um pixel. Mas há muita informação entre os pixels que é capturada mas não é óbvia", diz Gareth Mortan, CEO da Terrabotics.
"Por exemplo, podemos olhar uma mina e determinar se houve mudança - digamos que ela ficou mais profunda ou o acúmulo de resíduos ficou maior", cita.
Fotos da Lua
Competições também vêm estimulando a propagação de ideias revolucionárias.
O Ansari XPrize exige que os inventores desenvolvam uma nave espacial tripulada reutilizável. E agora o Google Lunar XPrize está oferecendo US$ 20 milhões (R$ 62,5 milhões) para a primeira equipe que consiga pousar um robô-sonda na Lua para percorrer 500 metros e transmitir fotos de volta à Terra.
Google premia start-up que colocar sonda na lua; empresa indiana está de olho
Trata-se de incentivar a inovação e novas formas de pensar o espaço, diz Rahul Narayan, fundador do Team Indus, de Bangalore, na Índia, que diz nunca ter tido experiência no setor.
"Nenhuma dessas pessoas tinha qualquer experiência em ciências espaciais, engenharia ou tecnologia", diz.
Vence prêmio quem conseguir pousar espaçonave na Lua (TEAM INDUS)
"É bom que não tenhamos tido", acrescenta ele, porque se fossem engenheiros espaciais, "nunca aceitaríamos um desafio tão grande quanto esse".
Sua equipe está agora aprimorando uma sonda lunar de 6 kg - uma das mais leves a aterrissar em um corpo planetário - que está programada para ser lançada nos próximos meses.
"Para nós, tem sido uma longa jornada", afirma ele, reconhecendo a dívida que tem com a estatal de pesquisas espaciais da Índia (ISRO).
Narayan vem recebendo ajuda de cientistas aposentados do órgão.
"Na minha cabeça, eles são os gigantes e nós somos apenas uma empresa muito menor nos ombros desses gigantes", destaca.
Enquanto levar uma sonda à Lua pode não resultar em uma recompensa comercial imediata, Narayan argumenta que se a aterrissagem planejada for bem-sucedida, será "um passo imenso para a companhia, para toda empresa espacial privada no mundo, para ir até lá e fazer mais coisas no futuro".
Trata-se de uma visão de mundo em que os satélites de baixo custo são carregados por foguetes acessíveis que são lançados quando você quiser - todos à distância de um clique, sem a necessidade de esperar por demoradas missões espaciais financiadas por governos.
Rahul Narayan, fundador do Team Indus, de Bangalore, na Índia, diz nunca ter tido experiência na área espacial (TEAM INDUS)
Avanço em série
Apesar disso, a mais recente corrida espacial apresenta seus próprios desafios, diz Gareth Morgan, da Terrabotics.
O grande volume de imagens e dados do espaço significa que os sistemas de inteligência artificial estão sendo usados para analisá-lo automaticamente vão precisar ser atualizados.
"Os sistemas atuais de inteligência artificial precisam de uma quantidade extraordinária de treinamento de classificação para que possam, então, independentemente reconhecer diferentes características por si próprios. Precisamos de uma mudança na forma como a inteligência artificial opera. Temos tido progresso, mas tudo ainda é muito novo", afirma.
De forma geral, mais informação pode ser uma coisa boa, mas há questões éticas em jogo - no fim das contas, todo mundo pode estar sendo fotografado do espaço todos os dias.
E quem tem acesso a esses dados? Na medida em que os satélites privados se proliferam e a revolução do "big data" prospera, críticos argumentam sobre a necessidade de um debate sobre os papéis público e privado no espaço.
"Não só governos ou grandes conglomerados podem comprar os nossos dados", diz Will Marshall, CEO da Planet Labs (PLANET LABS)
Will Marshall, da Planet Labs, concorda.
"Uma das coisas mais importantes para nós é que uma pessoa não possa ser reconhecida em nossas imagens. Claro que isso não significa que não haja implicações negativas", diz.
"Nós que lidamos com tecnologia temos de administrar esses dados da melhor forma possível", acrescenta.
Isso sem falar no problema do lixo espacial. Já existem cerca de 30 mil objetos, grandes e pequenos, em órbita. "Em última análise, teremos de lidar com esse problema", diz Marshall.
"A indústria vai ter de começar a retirar esses satélites do espaço e isso não será uma tarefa fácil", acrescenta.
De onde virá o dinheiro
Ainda que o negócio atraia investidores, os riscos são altos. Foguetes podem explodir, não decolarem ou colocar satélites errados em órbita.
"Os foguetes não são a forma de ganhar dinheiro com o espaço", diz Matt Perkins, que, por dez anos, foi CEO da Surrey Satellites e agora lidera o departamento de inovação da Universidade de Oxford, no Reino Unido.
Fundada por Peter Beck, Rocket Lab é a única empresa de foguetes no mundo com seu próprio complexo de lançamento
"A forma como você vai ganhar dinheiro é a ponta da cadeia - ou seja, usar toda essa informação que vem do espaço. À medida que isso ficar mais barato, haverá mais oportunidades comerciais - com dados sendo usados em formas que as pessoas jamais pensaram".
Como Perkins diz, há uma imensa gama de dados do espaço.
Nessa nova fronteira de negócios, caberá à engenhosidade dos humanos tirar bom proveito comercial disso.
FONTE: BBC BRASIL
Esqueça tudo o que você já sabe sobre a exploração espacial.
Desde o lançamento do primeiro satélite comercial, o Sputnik, em 1957, e do voo de Yuri Gagarin em 1961 (o primeiro a viajar ao espaço), a conquista do universo vem sendo dominada pela rivalidade entre Rússia (então União Soviética) e Estados Unidos - as duas potências chegaram, inclusive, a disputar quem colocaria o primeiro homem na Lua.
Nessa disputa, não havia espaço para empreendedores individuais - eram os governos quem tomavam as rédeas e pagavam pelos vultosos investimentos.
Russo Yuri Gagarin foi primeiro homem a ir ao espaço
É verdade que o primeiro satélite comercial - Intelsat I (apelidado de Early Bird) - foi lançado em 1965, mas até recentemente o desenvolvimento comercial do espaço foi quase que em sua totalidade limitado por grandes satélites de telecomunicações.
A um custo individual de centenas de milhões de dólares e pesando várias toneladas, eles eram concebidos para durar 15 anos, de modo que os investidores pudessem amortizar os gastos.
Apolo 14 foi terceiro pouso de uma nave na Lua (STF)
Mas uma revolução vem ocorrendo. Avanços tecnológicos estão transformando os modelos tradicionais de operação no espaço.
Uma série de empresas promete, agora, baratear o acesso ao espaço, usando desde foguetes reutilizáveis a sistemas de lançamento horizontais.
Os satélites também estão ficando menores e mais baratos de construir - há, agora, cerca de 1,5 mil deles orbitando ao redor de nós.
Em 1961, russo Yuri Gagarin, então com 27 anos, viajou ao espaço pela primeira vez (KEYSTONE)
Além disso, um fluxo impressionante de dados e imagens está chegando do espaço - e novos atores estão agora processando, interpretando e comercializando essa informação.
"Hoje, podemos criar um equipamento do tamanho de uma caixa de sapatos, que no passado seria do tamanho de um ônibus", explica Stuart Martin, CEO da Satellite Applications Catapult, uma incubadora de negócios sediada no Reino Unido que ajuda start-ups voltadas para a exploração espacial.
EUA foi primeiro país a chegar à Lua; na foto, Edwin 'Buzz' Aldrin (NASA)
O investimento está aumentando no setor espacial. Em 2016, essa indústria somou US$ 329 bilhões (R$ 1 milhão), com três quartos do total vindo de empresas - e não de governos.
Os foguetes são a nossa porta de entrada para o espaço, ou seja, caminhões de entrega essenciais. Eles encapsulam nossos esforços para se tornar uma verdadeira civilização espacial. E quando se trata de foguetes, são os bilionários que estão liderando essa empreitada.
Com Blue Origin, Jeff Bezos, fundador e CEO da Amazon, está desenvolvendo seus próprios lançadores (BLUE ORIGIN)
O americano Elon Musk, da SpaceX, está usando seus foguetes Falcon 9 para abastecer a Estação Espacial Internacional, enquanto a Blue Origin, de Jeff Bezos, fundador e CEO da Amazon, está desenvolvendo seus próprios lançadores.
As duas empresas vêm demonstrando técnicas revolucionárias que permitem um pouso vertical - um passo significativo no reuso de foguetes.
Americano John Glenn foi primeiro austronauta a entrar em órbita da Terra (GETTY IMAGES)
Enquanto isso, Richard Branson, dono do grupo Virgin, está focado em desenvolver satélites que podem ser lançados do ar. Isso sem falar em seus planos para voos turísticos suborbitais.
Um dos novos atores dessa indústria em ebulição é a Rocket Lab, da Nova Zelândia.
Ainda engatinhando, é a única empresa de foguetes no mundo com seu próprio complexo de lançamento, localizada na Península Mahia, na Ilha do Norte.
Neste momento, nenhuma companhia de lançamento opera puramente sob uma lógica comercial.
Cápsula New Shepard, da Blue Origin, faz pouso vertical (BLUE ORIGIN)
"Todas elas são fortemente subsidiadas pelos governos de um jeito ou de outro", explica Stuart Martin.
Enquanto os foguetes não mudaram muito desde o Sputnik, em 1957, seria um erro pensar no Rocket Lab como mais um simples fabricante de foguetes tradicional, defende seu fundador, Peter Beck.
Terrabotics captura imagens da Terra (TERRABOTICS)
"Há muita informação entre os pixels que é capturada mas não é óbvia", diz Gareth Mortan, CEO da Terrabotics (TERRABOTICS)
Atualmente, o custo médio de um lançamento de um foguete é de US$ 200 milhões (R$ 625 milhões), e somente nos Estados Unidos no ano passado, por exemplo, houve 22 lançamentos.
Beck diz que, quando seu foguete estiver em operação, será possível ir ao espaço por US$ 5 milhões (R$ 15,6 milhões), e "tão frequentemente quanto uma vez por semana".
A joia da coroa da Rocket Lab é o foguete Electron, desenhado especificamente para levar pequenos satélites ao espaço. O foguete é feito principalmente de fibra de carbono, e seus motores são concebidos a partir de uma impressora 3D.
Dessa forma, diz Beck, em vez de levar meses para produzir um propulsor, "podemos produzi-lo em 24 horas".
Em seu primeiro voo teste, em maio deste ano, o foguete conseguiu chegar ao espaço, mas não entrou em órbita. Dois novos testes estão planejados.
Neste momento, fabricantes de pequenos satélites acabam pegando carona nos lançamentos atuais, que tem um grande satélite como seu principal carregamento, mas ainda assim com espaço para acomodar outros menores.
No entanto, como a demanda pela observação da Terra vem aumentando - clima, viagens, mapas - fabricantes estão flexibilizando as formas de chegar ao espaço.
Essa é a lacuna que o Rocket Lab está planejando preencher, diz Beck. Em vez de esperar por um espaço disponível em um grande foguete, "agora você pode entrar na internet e, por meio de um clique, comprar um lançamento".
Um retrato do planeta
Uma empresa ávida por usar o lançamento da Rocket Lab é a Planet Labs. Sediada em São Francisco, na Califórnia (EUA), a Rocket Lab desenha e constrói seus próprios nanosatélites, que pesam apenas 4 kg.
Diferentemente dos tradicionais satélites de comunicação comercial em órbita geoestacionária, a 35,7 mil km acima da Terra, os satélites da Planet Labs (apelidados de Doves, ou "pombas" em inglês) voam muito mais baixo, a apenas 500 km - uma distância um pouco maior entre Rio e São Paulo.
Empresa de ex-funcionários da Nasa quer 'fotografar' o mundo todo do espaço
A órbita mais baixa sugere que a espaçonave pode usar câmeras menores e, apesar disso, produzir imagem com resolução decente - reduzindo o peso e o custo a uma fração da dos satélites tradicionais.
Além disso, novos designs podem ser testados e construídos rapidamente por causa de seu tamanho e preço, diz a empresa.
Em fevereiro deste ano, a Planet Labs enviou 88 satélites ao espaço, e, em julho, outros 48.
A empresa pode agora fotografar qualquer ponto do planeta todos os dias.
"Conseguimos eliminar as restrições de oferta que existiam e reduzir os custos das imagens que estamos registrando - em proporções imensas", diz Will Marshall, cofundador da Planet Labs.
Segundo ele, isso não só significa preços menores para os consumidores, como também garante que os dados disponíveis possam atingir um maior número de pessoas.
Americano Elon Musk, da SpaceX, está usando foguetes Falcon 9 para abastecer Estação Espacial Internacional (JOE RAEDLE)
"Não só governos ou grandes conglomerados podem comprar os nossos dados. Qualquer um pode acessá-los - independentemente se for uma empresa de porte pequeno ou médio, uma ONG, ou um pesquisador em uma universidade", explica.
Start-up quer lançar satélites do tamanho de micro-ondas ao espaço
Apesar disso, enquanto o desenvolvimento de foguetes e satélites - o "hardware" do espaço - ainda concentra todas as atenções, as maiores mudanças estão relacionadas ao uso prático da informação obtida.
Agricultores e companhias de minério, gás e petróleo já estão usando os dados.
Os agricultores, por exemplo, podem ser alertados sobre problemas com as condições do solo, o que ajuda a melhor prepará-los para colheitas ruins. Os pescadores, por outro lado, podem ser avisados sobre as temperaturas dos oceanos e assim saber onde buscar os peixes. Com imagens cada vez mais precisas, árvores podem ser rastreadas de modo a garantir que a madeira seja certificada, evitando, assim, o desmatamento.
Planet Labs pode agora fotografar qualquer ponto do planeta todos os dias (PLANET LABS)
Uma das empresas que está filtrando essa torrente de informação é a Terrabotics, sediada no Reino Unido.
"Em uma imagem normal, você está limitado ao tamanho de um pixel. Mas há muita informação entre os pixels que é capturada mas não é óbvia", diz Gareth Mortan, CEO da Terrabotics.
"Por exemplo, podemos olhar uma mina e determinar se houve mudança - digamos que ela ficou mais profunda ou o acúmulo de resíduos ficou maior", cita.
Fotos da Lua
Competições também vêm estimulando a propagação de ideias revolucionárias.
O Ansari XPrize exige que os inventores desenvolvam uma nave espacial tripulada reutilizável. E agora o Google Lunar XPrize está oferecendo US$ 20 milhões (R$ 62,5 milhões) para a primeira equipe que consiga pousar um robô-sonda na Lua para percorrer 500 metros e transmitir fotos de volta à Terra.
Google premia start-up que colocar sonda na lua; empresa indiana está de olho
Trata-se de incentivar a inovação e novas formas de pensar o espaço, diz Rahul Narayan, fundador do Team Indus, de Bangalore, na Índia, que diz nunca ter tido experiência no setor.
"Nenhuma dessas pessoas tinha qualquer experiência em ciências espaciais, engenharia ou tecnologia", diz.
Vence prêmio quem conseguir pousar espaçonave na Lua (TEAM INDUS)
"É bom que não tenhamos tido", acrescenta ele, porque se fossem engenheiros espaciais, "nunca aceitaríamos um desafio tão grande quanto esse".
Sua equipe está agora aprimorando uma sonda lunar de 6 kg - uma das mais leves a aterrissar em um corpo planetário - que está programada para ser lançada nos próximos meses.
"Para nós, tem sido uma longa jornada", afirma ele, reconhecendo a dívida que tem com a estatal de pesquisas espaciais da Índia (ISRO).
Narayan vem recebendo ajuda de cientistas aposentados do órgão.
"Na minha cabeça, eles são os gigantes e nós somos apenas uma empresa muito menor nos ombros desses gigantes", destaca.
Enquanto levar uma sonda à Lua pode não resultar em uma recompensa comercial imediata, Narayan argumenta que se a aterrissagem planejada for bem-sucedida, será "um passo imenso para a companhia, para toda empresa espacial privada no mundo, para ir até lá e fazer mais coisas no futuro".
Trata-se de uma visão de mundo em que os satélites de baixo custo são carregados por foguetes acessíveis que são lançados quando você quiser - todos à distância de um clique, sem a necessidade de esperar por demoradas missões espaciais financiadas por governos.
Rahul Narayan, fundador do Team Indus, de Bangalore, na Índia, diz nunca ter tido experiência na área espacial (TEAM INDUS)
Avanço em série
Apesar disso, a mais recente corrida espacial apresenta seus próprios desafios, diz Gareth Morgan, da Terrabotics.
O grande volume de imagens e dados do espaço significa que os sistemas de inteligência artificial estão sendo usados para analisá-lo automaticamente vão precisar ser atualizados.
"Os sistemas atuais de inteligência artificial precisam de uma quantidade extraordinária de treinamento de classificação para que possam, então, independentemente reconhecer diferentes características por si próprios. Precisamos de uma mudança na forma como a inteligência artificial opera. Temos tido progresso, mas tudo ainda é muito novo", afirma.
De forma geral, mais informação pode ser uma coisa boa, mas há questões éticas em jogo - no fim das contas, todo mundo pode estar sendo fotografado do espaço todos os dias.
E quem tem acesso a esses dados? Na medida em que os satélites privados se proliferam e a revolução do "big data" prospera, críticos argumentam sobre a necessidade de um debate sobre os papéis público e privado no espaço.
"Não só governos ou grandes conglomerados podem comprar os nossos dados", diz Will Marshall, CEO da Planet Labs (PLANET LABS)
Will Marshall, da Planet Labs, concorda.
"Uma das coisas mais importantes para nós é que uma pessoa não possa ser reconhecida em nossas imagens. Claro que isso não significa que não haja implicações negativas", diz.
"Nós que lidamos com tecnologia temos de administrar esses dados da melhor forma possível", acrescenta.
Isso sem falar no problema do lixo espacial. Já existem cerca de 30 mil objetos, grandes e pequenos, em órbita. "Em última análise, teremos de lidar com esse problema", diz Marshall.
"A indústria vai ter de começar a retirar esses satélites do espaço e isso não será uma tarefa fácil", acrescenta.
De onde virá o dinheiro
Ainda que o negócio atraia investidores, os riscos são altos. Foguetes podem explodir, não decolarem ou colocar satélites errados em órbita.
"Os foguetes não são a forma de ganhar dinheiro com o espaço", diz Matt Perkins, que, por dez anos, foi CEO da Surrey Satellites e agora lidera o departamento de inovação da Universidade de Oxford, no Reino Unido.
Fundada por Peter Beck, Rocket Lab é a única empresa de foguetes no mundo com seu próprio complexo de lançamento
"A forma como você vai ganhar dinheiro é a ponta da cadeia - ou seja, usar toda essa informação que vem do espaço. À medida que isso ficar mais barato, haverá mais oportunidades comerciais - com dados sendo usados em formas que as pessoas jamais pensaram".
Como Perkins diz, há uma imensa gama de dados do espaço.
Nessa nova fronteira de negócios, caberá à engenhosidade dos humanos tirar bom proveito comercial disso.
FONTE: BBC BRASIL
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