Esta imagem mostra um dos eventos de neutrino mais energéticos do estudo, sobreposto numa imagem do ICL (IceCube Lab) no Pólo Sul.
Crédito: Colaboração IceCube
A Colaboração IceCube anunciou, no passado dia 20 de agosto, uma nova observação de neutrinos de alta energia originários de fora do nosso Sistema Solar. Este estudo, que procurou neutrinos vindos do Hemisfério Norte, confirma a sua origem cósmica bem como a presença de neutrinos extragaláticos e a intensidade da taxa de neutrinos. A primeira evidência de neutrinos astrofísicos foi anunciada pela colaboração em novembro de 2013. Os resultados publicados agora na revista Physical Review Letters são a primeira confirmação independente desta descoberta.
"A procura por neutrinos do muão que chegam ao detetor, passando pelo interior da Terra, é o modo como o IceCube faz astronomia de neutrinos e, com este artigo, prova-o," afirma Francis Halzen, investigador principal do IceCube e professor de física da Universidade de Wisconsin-Madison. "Não é como o CMS (Compact Muon Solenoid) ou o ATLAS (A Toroidal LHC ApparatuS) - ambos do LHC -, mas é tão perto de uma confirmação independente quanto possível para um único instrumento."
Os neutrinos são partículas sub-atômicas que viajam por todo o Universo quase sem serem incomodados pela matéria, apontando diretamente para as fontes de energia onde foram criados. E para os neutrinos mais energéticos, essas fontes deverão ser os ambientes mais extremos do Universo: poderosos geradores cósmicos, como buracos negros ou a explosão de estrelas gigantescas, objetos capazes de acelerar os raios cósmicos para energias mais de um milhão de vezes superiores àquelas alcançadas pelos aceleradores feitos pelo Homem, como o LHC no CERN.
"Os neutrinos cósmicos são a chave para partes ainda inexploradas do nosso Universo e poderão finalmente revelar as origens dos raios cósmicos mais energéticos, incluindo as raras partículas 'Oh-My-God'", afirma Olga Botner, porta-voz da colaboração e da Universidade de Uppsala. "A descoberta de neutrinos astrofísicos aponta para o início de uma nova era na astronomia."
Os neutrinos nunca são observados diretamente, mas o IceCube é capaz de ver os subprodutos de uma interação entre um neutrino e o gelo da Antártida. Este detetor com um quilômetro cúbico regista cem mil neutrinos por ano, a maioria produzidos pela interação dos raios cósmicos com a atmosfera da Terra. Milhares de milhões de múons atmosféricos criados nas mesmas interações também deixam vestígios no IceCube. De todos estes, os investigadores procuram apenas algumas dúzias de neutrinos astrofísicos, que vão ampliar a nossa compreensão atual do Universo.
A pesquisa apresentada há poucos dias pela Colaboração IceCube usa uma velha estratégia para um telescópio de neutrinos: observa o Universo através da Terra, usando o nosso planeta para filtrar o grande fundo de múons atmosféricos. Entre maio de 2010 e maio de 2012, foram encontrados nos dados mais de 35.000 neutrinos. À energia mais alta, acima dos 100 TeV, a taxa medida não pode ser explicada por neutrinos produzidos na atmosfera da Terra, indicando a natureza astrofísica dos neutrinos de alta energia. A análise apresentada neste artigo sugere que mais de metade dos 21 neutrinos acima dos 100 TeV têm origem cósmica.
Esta observação independente, com uma significância de 3,7 sigma e em boa concordância com os resultados anteriores da Colaboração Icecube, também confirma a elevada taxa de neutrinos astrofísicos. Apesar dos cientistas ainda os contarem "ao punhado", os resultados do IceCube estão perto dos valores máximos com base nas fontes potenciais de raios cósmicos. A intensidade deste fluxo mostra que as fontes de raios cósmicos são geradores eficientes de neutrinos. E, portanto, estas pequenas partículas são ainda mais tidas em conta como as ferramentas perfeitas para explorar o Universo extremo.
Mapa celeste em coordenadas equatoriais da direção de chegada dos 21 eventos mais energéticos da análise (círculos vermelhos). A energia mais provável do neutrino (em TeV) indicada para cada evento assume o mais bem ajustado fluxo astrofísico da análise. Para efeitos de comparação, também são apresentados os eventos da análise de 3 anos (HESE) com energias depositadas superiores a 60 TeV ("tracks" e "cascades"). Os eventos de cascata são indicados juntamente com a sua incerteza angular média (círculos verdes).
Os neutrinos de alta energia observados pertencem a uma nova amostra de neutrinos, tendo apenas um evento em comum com os primeiros resultados anunciados em 2013, que procurou neutrinos de alta energia que tinham interagido com o gelo dentro do IceCube durante o mesmo período de obtenção de dados. A pesquisa atual focou-se apenas nos neutrinos do múon. Estes neutrinos produzem um múon quando interagem com o gelo e têm uma assinatura característica no IceCube, que chamam de "track" (termo em inglês), o que os torna fácil de identificar. É esperada a mesma forma para um múon atmosférico, mas ao observar apenas o Hemisfério Norte, os cientistas sabem que um múon detetado só pode ter sido produzido pela interação de um neutrino.
Estas "tracks" induzidas por neutrinos têm uma boa resolução de apontamento, que podem usar para localizar as suas fontes com uma precisão inferior a 1 grau. No entanto, os estudos do IceCube ainda não encontraram um número significativo de neutrinos provenientes de uma única fonte. O fluxo de neutrinos medidos pelo IceCube no Hemisfério Norte tem a mesma intensidade que o fluxo astrofísico medido no Hemisfério Sul. Isto suporta a ideia de uma grande população de fontes extragaláticas, caso contrário as fontes na Via Láctea dominariam o fluxo em torno do plano galáctico.
Além disso, esta nova amostra de neutrinos de alta energia, quando combinada com as medições anteriores do IceCube, permitem as medições mais precisas, até à data, do espectro de energia e da composição do fluxo de neutrinos extraterrestres. Estes resultados foram publicados num segundo artigo na revista The Astrophysical Journal.
O IceCube, gerido pela Colaboração Icecube, é um detetor de partículas localizado perto da Estação Amundsen-Scott no Pólo Sul. Está enterrado abaixo da superfície e estende-se até uma profundidade de aproximadamente 2500 metros. Uma rede à superfície, o IceTop, e um sub-detector interno mais denso, DeepCore, melhoram significativamente as capacidades do observatório, tornando-o numa instalação multiusos.
FONTE: ASTRONOMIA ONLINE
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