Uma nova pesquisa sugere que a nossa galáxia contém até 100 bilhões de anãs marrons – um tipo de objeto celestial que não tinha o necessário para se tornar uma estrela de fato. A descoberta mostra exatamente como as anãs marrons são comuns e quantos começos falhos estão envolvidos na formação de novas estrelas.
Anãs marrons existem em uma área nebulosa da astronomia. Elas são muito quentes e grandes para ser planetas, cerca de 15 a 80 vezes a massa de Júpiter, mas muito pequenas para serem estrelas, sem massa suficiente para manter a fusão de hidrogênio estável em seus núcleos. As anãs marrons são resultado de processos que normalmente levam à formação de estrelas, de modo que muitas vezes são chamadas de “estrelas fracassadas”. Pesado, mas é assim que funciona a astronomia.
Em 2013, os astrônomos começaram a perceber que as anãs marrons são um elemento bastante comum da galáxia, oferecendo uma estimativa de 70 bilhões. Mas uma nova análise apresentada nesta sexta-feira (7), no Encontro Nacional de Astronomia, na Universidade de Hull, está dizendo oferecer o número mais preciso até o momento, uma estimativa revisada de 100 bilhões. Dado que a Via Láctea contém algo entre 100 a 400 bilhões de estrelas reais, essa descoberta implica que nossa galáxia está cheia de fracassos flutuantes.
Até agora, os astrônomos descobriram milhares de anãs marrons, cuja grande maioria está localizada a mais de 1.500 anos-luz de distância. Esses objetos são muito fracos, tornando difícil sua observação de longa distância, se não impossível. A maioria das anãs marrons que conhecemos foram detectadas em regiões próximas de formação de estrelas conhecidas como aglomerados. Um desses agrupamentos é o NGC 133, que possui metade de anãs marrons e metade de estrelas.
Imagem de cor falsa próxima ao infravermelho do núcleo do jovem grupo massivo RCW 38 tirada com a câmera de óptica adaptativa NACO, no Very Large Telescope, da ESO (Imagem: Koraljka Muzic, University of Lisbon, Portugal / Aleks Scholz, University of St Andrews, UK / Rainer Schoedel, University of Granada, Spain / Vincent Geers, UKATC / Ray Jayawardhana, York University, Canada / Joana Ascenso, University of Lisbon, University of Porto, Portugal / Lucas Cieza, University Diego Portales, Santiago, Chile)
Esse número parece estranhamente elevado para Aleks Scholz, da Universidade de St. Andrews, e sua colega Koraljka Muzic, da Universidade de Lisboa. Para ter uma melhor ideia da taxa de formação de anãs marrons dentro de grupos de diferentes densidades estelares, esses pesquisadores foram em busca de anãs marrons em uma região de formação de estrelas mais distante, muito mais densa, conhecida como RCW38.
Para ver esse conjunto distante, que está localizado a 5.000 anos-luz de distância, os astrônomos optaram por usar a câmera de óptica adaptável NACO, do Very Large Telescope, do Observatório Europeu do Sul. Como em pesquisas anteriores, eles encontraram metade anãs marrons e metade estrelas, o que implica que a formação e a freqüência de anãs marrons têm muito pouco a ver com a composição dos aglomerados de estrelas.
“Encontramos muitas anãs marrons nesses aglomerados”, disse Scholz em um comunicado. “E seja qual for o tipo de aglomerado, as anãs marrons são realmente comuns. Anãs marrons formam-se ao lado de estrelas em conjuntos, então nosso trabalho sugere que há um grande número de anãs marrons lá fora.”
Esse grande número pode chegar a 100 bilhões, extrapolando as observações dos pesquisadores da galáxia inteira e preusmindo uma maior taxa de formação de estrelas no passado da Via Láctea. Mas essa estimativa pode ser baixa, já que muitas anãs marrons mais fracas provavelmente não foram detectadas.
É importante ressaltar que esse artigo ainda não aparece em um periódico científico revisado (uma pré-impressão pode ser lida no arXiv), então teremos que aceitar essas descobertas com certa cautela. Dito isto, John O’Meara, um astrônomo da faculdade de St. Michael que não esteve envolvido no estudo, diz que esse número é plausível.
“Eles chegam ao número de 100 bilhões, fazendo várias suposições”, disse O’Meara ao Gizmodo. “O que eles realmente fazem no artigo é contar as anãs marrons em um conjunto de estrelas para derivar o que os astrônomos chamam de FMI (função de massa inicial), que é basicamente a distribuição de massas de estrelas em um conjunto. Quando você sabe isso e conhece a taxa com que a galáxia forma estrelas, você pode estimar o número total de um certo tipo de estrela. O que essa equipe fez foi fazer essa extrapolação e então também presumir que a formação de estrelas no passado da galáxia era maior (uma aposta razoavelmente segura). Sem a maior quantidade de formação estelar no passado, o número é menor, uns 10-30 bilhões. Eu diria que a estimativa [100 bilhões] é plausível no final, se você aceitar as suposições.”
E comparando a formação de anãs marrons em dois grupos bem diferentes, um com baixa densidade de estrelas e outro com alta densidade, os pesquisadores demonstraram que o ambiente estelar não é necessariamente um fator que regula a capacidade de uma região formadora de estrelas produzir esses objetos. “A formação de anãs marrons é uma parte universal da formação estelar em geral”, disse O’Meara.
O professor Abel Méndez, do Laboratório de Habitabilidade Planetária, outro astrônomo que não esteve envolvido no estudo, diz que os números no novo artigo fazem sentido, já que os objetos estelares menores são mais abundantes na galáxia.
“Por exemplo, as pequenas estrelas anãs vermelhas são muito mais abundantes que todas as outras estrelas juntas”, disse Méndez ao Gizmodo. “A nova estimativa é um limite provavelmente mais baixo… os planetas flutuantes [que são semelhantes às anãs marrons] devem ser mais comuns.”
O lado ruim é que o grande número de estrelas fracassadas não é bom para as perspectivas de vida extraterrestre. Méndez tem dúvidas sobre a possibilidade de que as anãs marrons sejam suficientemente estáveis a longo prazo para manter qualquer coisa próxima do habitável.
Por fim, só para constar, nem todos os astrônomos gostam do termo “estrelas fracassadas”.
“Eu prefiro não chamar as anãs marrons de ‘estrelas fracassadas’, pois isso implica que falta alguma coisa a elas”, disse Jacqueline K. Faherty, astrofísica do Museu Americano de História Natural, em um email para o Gizmodo. “Eu gosto de ‘planetas superexcitados’, pois no espectro inferior de massa, eles são bem mais como um planeta do que uma estrela.”
A sugestão de O’Meara foi para substituir “estrela fracassada” por “bem motivada, mas não chega lá”, mas ele admite que é um pouco longo. No final das contas, sejam as anãs marrons estrelas fracassadas ou não, depende do nosso próprio sentido ontológico do universo.
Imagem do topo: NASA / JPL-Caltech
FONTE: GIZMODO BRASIL
Comentários
Postar um comentário