Ilustração da estrela KELT-9 e do seu planeta ultraquente KELT-9b.
Crédito: Robert Hurt/NASA/JPL-Caltech
Um mundo recém-descoberto, parecido com Júpiter, é tão quente que está a ser vaporizado pela sua própria estrela.
Com uma temperatura diurna de mais de 4600 Kelvin, o exoplaneta KELT-9b é mais quente do que a maioria das estrelas. Mas a sua estrela azul do tipo A, chamada KELT-9, é ainda mais quente - na verdade, está provavelmente a destruir o planeta através da sua evaporação.
"Este é o gigante gasoso mais quente já descoberto," comenta Scott Gaudi, professor de astronomia da Universidade Estatal do Ohio em Columbus, EUA, que liderou um estudo sobre o tema. Ele trabalhou neste estudo durante uma licença sabática no JPL da NASA em Pasadena, no estado norte-americano da Califórnia. O invulgar exoplaneta foi apresentado na revista Nature e numa conferência da reunião de verão da Sociedade Astronómica Americana em Austin, Texas.
KELT-9b tem 2,8 vezes a massa de Júpiter mas apenas metade da sua densidade. Os cientistas esperariam que o planeta tivesse um raio mais pequeno, mas a radiação extrema da sua estrela hospedeira fez com que a atmosfera do planeta inchasse como um balão.
Tendo em conta que o planeta sofre o efeito de acoplamento de maré em relação à sua estrela - como a Lua com a Terra -, um lado está sempre virado para a estrela e o outro sempre na direção oposta, em escuridão eterna. Moléculas como a água, dióxido de carbono e metano não podem formar-se no lado diurno porque este é bombardeado por demasiada radiação ultravioleta. As propriedades do lado noturno ainda permanecem misteriosas - aí, é provável que estas moléculas se consigam formar, mas talvez apenas temporariamente.
"É um planeta segundo as definições típicas de massa, mas a sua atmosfera é quase de certeza diferente de qualquer outro planeta já descoberto devido à sua temperatura no lado diurno," explica Gaudi.
A estrela KELT-9 tem apenas 300 milhões de anos, o que, num contexto estelar, a torna jovem. Tem mais do dobro do tamanho do Sol e é quase duas vezes mais quente. Dado que a atmosfera do planeta é constantemente bombardeada com altos níveis de radiação ultravioleta, o planeta pode até estar a "derramar" uma cauda de material planetário evaporado como se se tratasse de um cometa.
"KELT-9 irradia tanta radiação ultravioleta que poderá evaporar completamente o planeta," explica Keivan Stassun, professor de física e astronomia da Universidade Vanderbilt em Nashville, no estado norte-americano do Tennessee, que liderou o estudo com Gaudi.
Mas este cenário assume que a estrela não cresce para engolir o planeta primeiro.
"KELT-9 vai inchar para se tornar numa gigante vermelha daqui a algumas centenas de milhões de anos," explica Stassun. "As perspetivas a longo prazo, para KELT-9b, não são boas."
O planeta também é invulgar no aspeto que orbita perpendicularmente à rotação da estrela. Isso seria análogo ao planeta orbitar perpendicularmente ao plano do nosso Sistema Solar. Um "ano" neste planeta corresponde a menos de dois dias.
KELT-9b não é, nem de perto, habitável, mas Gaudi diz que existe uma boa razão para estudar mundos extremamente inóspitos.
O telescópio KELT-norte no Arizona.
Crédito: Colaboração KELT
"Tal como tem sido destacado pelas recentes descobertas da colaboração MEarth, do planeta em redor de Proxima Centauri, e do impressionante sistema descoberto em redor de TRAPPIST-1, a comunidade astronômica está claramente focada em encontrar planetas parecidos com a Terra em redor de estrelas mais pequenas e frias como o nosso Sol. São alvos fáceis e, no geral, podemos aprender muito sobre os planetas potencialmente habitáveis em órbita de estrelas de baixa massa. Por outro lado, dado que a estrela-mãe de KELT-9b é maior e mais quente do que o Sol, complementa esses esforços e fornece uma espécie de alicerce para a compreensão de como os sistemas planetários se formam em torno de estrelas quentes e massivas," acrescenta Gaudi.
O planeta KELT-9b foi descoberto usando um dos dois telescópios KELT (Kilodegree Extremely Little Telescope). No final de maio e início de junho de 2016, os astrônomos que usavam o telescópio KELT-norte do Observatório Winer, no estado norte-americano do Arizona, notaram uma queda pequena no brilho da estrela - cerca de 0,5% - que indicava a passagem, ou trânsito, de um planeta em frente da estrela. O brilho diminuía a cada 1,5 dias, o que significa que o planeta completa um circuito "anual" em redor da sua estrela a cada 1,5 dias.
As observações subsequentes confirmaram que o sinal era realmente consequência da presença de um planeta e revelaram o que os astrônomos chamam de "Júpiter quente" - o tipo de planeta que os telescópios KELT foram desenhados para avistar.
Os astrônomos da Universidade Estatal do Ohio, da Universidade de Lehigh em Bethlehem, estado de Pensilvânia, e da Universidade Vanderbilt operam em conjunto os dois KELTs (um no hemisfério norte e o outro no hemisfério sul) para preencher uma grande lacuna nas tecnologias disponíveis de detecção exoplanetária. Outros telescópios foram construídos para observar estrelas ténues em secções muito mais pequenas do céu e numa resolução bem maior. Em contraste, os KELTs observam milhões de estrelas muito brilhantes ao mesmo tempo, abrangendo amplas regiões do céu e em baixa resolução.
"Esta descoberta é prova do poder de descoberta dos telescópios pequenos e da capacidade dos cientistas-cidadão para contribuir diretamente para a investigação científica de ponta," salienta Joshua Pepper, astrônomo e professor assistente de física na Universidade de Lehigh em Bethlehem, no estado da Pensilvânia, que construiu os dois telescópios KELT.
Os astrônomos esperam observar KELT-9b mais detalhadamente com outros telescópios - incluindo os telescópios Spitzer e Hubble da NASA e, eventualmente, com o Telescópio Espacial James Webb, que tem lançamento previsto para 2018. As observações com o Hubble permitirão ver se o planeta tem realmente uma cauda cometária e determinar quanto tempo o planeta ainda resistirá às condições infernais do sistema.
"Graças ao calor parecido com uma estrela deste planeta, é um alvo excecional para observar em todos os comprimentos de onda, desde o ultravioleta até ao infravermelho, tanto durante o trânsito como durante o eclipse. Estas observações vão permitir-nos obter uma visão completa da sua atmosfera, na medida do possível para um planeta para lá do nosso Sistema Solar," afirma Knicole Colon, coautora do artigo, do Centro de Pesquisa Ames da NASA durante este estudo.
FONTE: http://www.ccvalg.pt
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