Cientistas brasileiros descobriram um enorme recife de 9.500 km² na foz do rio Amazonas. Ele passou despercebido por muito tempo, e abriga algumas formas de vida bem curiosas.
O termo “recife de corais” costuma remeter a águas tropicais cristalinas e corais coloridos. Talvez por isso, ninguém nunca se preocupou em olhar para o escoamento do rio com a maior vazão de água do mundo.
O rio Amazonas tem uma taxa de escoamento que chega a 300.000 m³ de água repleta de sedimentos a cada segundo. Isso gera uma nuvem espessa, semelhante a smog, que reduz os níveis de luz e oxigênio no fundo do mar. Então você pode imaginar a surpresa dos cientistas em descobrir um enorme recife por lá. Um artigo descrevendo a descoberta foi publicado na revista Science Advances.
Eles explicam que este é um “recife biogênico”, isto é, um conjunto de animais, plantas e micróbios que vivem nas profundezas e mineralizam esqueletos de calcário ou sílica.
O tipo mais conhecido é o clássico recife de coral, que ocorre em águas rasas, quentes e pobres em nutrientes. O recife do rio Amazonas é uma variação disso, abrigando esponjas, corais-pétreos e peixes de água rasa.
Corais (à esquerda) e esponjas (à direita) coletados na foz do rio Amazonas (Thompson et al, Science Advances)
“Este tipo de recife biogênico vem sendo descoberto com mais frequência nos últimos anos”, diz Fabiano Thompson, oceanógrafo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, ao Gizmodo. “Mas nós não estamos cientes deste tipo exato de recife em outros lugares. Um sistema especial se formou aqui.”
Há anos, pessoas vêm encontrando corais e outros organismos construtores de recifes perto da foz do Amazonas. Mas só quando Thompson e seus colegas começaram uma extensa pesquisa de campo em 2012, passamos a entender como este ecossistema era difundido.
Dominado por esponjas e algas vermelhas chamadas rodolitos – que formam crostas de calcário – o recife se estende ao longo de uma faixa com aproximadamente mil quilômetros na plataforma continental rasa, desde a fronteira da Guiana Francesa até o Maranhão.
O mapa do recife biogênico na foz do rio Amazonas (Thompson et al, Science Advances)
O recife corta através de toda a foz do Amazonas, e as condições ambientais mudam drasticamente ao longo do seu comprimento. No norte, a pluma do rio lança uma sombra pesada, tornando escassos tanto a luz como o oxigênio. Mais ao sul, a água se torna mais clara, mais ensolarada e bem arejada. Isto resulta em comunidades ecológicas distintas ao longo do comprimento do recife.
Na parte sul do recife, a cadeia alimentar é baseada em algas que realizam fotossíntese, produzindo açúcar a partir de luz solar e sustentando uma mistura diversificada de esponjas e corais. Mas à medida que você viaja para o norte, a luz solar é menos frequente e a paisagem ecológica muda. Algas minúsculas são substituídas por uma classe mais exótica de produtores primários: trata-se de micróbios que podem fazer sua própria comida retirando energia a partir de produtos químicos inorgânicos – cientistas chamam esse processo de quimiossíntese.
Micróbios quimiossintéticos costumam ser encontrados em ambientes extremos, tais como fossas profundas do oceano ou lagos subterrâneos, mas raramente eles são numerosos o bastante para sustentar um grande ecossistema macroscópico.
“Este é o primeiro recife quimiossintético que usa minerais – como amônia e enxofre – para sustentar o recife, em vez de luz e produção primária”, diz Thompson. “Isso poderia tornar o sistema bastante único.”
Mesmo sendo único, o recife amazônico do norte se junta a um crescente número de sistemas em todo o mundo que são totalmente distintos dos clássicos recifes dominados por corais.
Por exemplo, coloridos “jardins de esponja” prosperam na costa oeste da Austrália e no litoral da Colúmbia Britânica (Canadá). Enquanto isso, há corais espetaculares vivendo a quilômetros abaixo da superfície do oceano, onde o sol nunca brilha. Thompson diz ser possível que a quimiossíntese também ajude a sustentar alguns desses moradores das profundezas.
Embora o recife amazônico esteja sendo explorado só agora, ele enfrenta inúmeras ameaças causadas pela humanidade, como plataformas de petróleo e exploração de gás, pesca industrial e mudança climática. Até mesmo os recifes “tradicionais” de coral ao redor do mundo vêm sofrendo o branqueamento mais intenso já registrado. Descobertas como esta nos lembram por que é tão importante proteger os ecossistemas marinhos frágeis – imagine todas as outras maravilhas que ainda não foram encontradas.
Foto: a foz do rio Amazonas (Wikimedia)
FONTE: GIZMODO BRASIL
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